Vamos falar sobre dignidade menstrual?

Recentemente o presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei 14.214, que cria o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual. Se não fossem os vetos, que descaracterizaram os avanços que a Lei representaria, certamente a sanção seria uma conquista.

Para entender melhor que conquistas/retrocessos estamos falando e aproximar a discussão sobre saúde menstrual, compartilhamos alguns conceitos trazidos no Relatório “Livre Para Menstruar”, organizado pela Girl Up, e como eles se materializam no dia a dia de quem menstrua. E adiantamos, falar sobre menstruação e os impactos que ela pode trazer é um importante passo para combater estigmas e garantir nossa saúde menstrual. Confira!

1. CONCEITOS:

Dignidade Menstrual: “a menstruação está intrinsecamente relacionada à dignidade humana, pois quando as pessoas não podem acessar instalações de banho seguras e meios seguros e eficazes de administrar sua higiene menstrual, elas não são capazes de administrar sua menstruação com dignidade. As provocações, a exclusão e a vergonha relacionadas à menstruação também comprometem o princípio da dignidade humana. Assim, a dignidade menstrual tem por meta remover qualquer ameaça a uma vivência da menstruação como fenômeno natural e saudável.”

Educação Menstrual: “refere-se ao amplo acesso à informação sobre o ciclo menstrual, contemplando-se a perspectiva biológica, emocional, social e as questões de sustentabilidade. A educação menstrual deve ser oferecida a todos, mas é de suma importância que meninas sejam apresentadas ao tema antes da primeira menstruação. Por meio do diálogo livre de estigmas e a partir de informações baseadas em evidências, a educação menstrual impacta positivamente a vida das pessoas que menstruam e de suas comunidades.”

Manejo da higiene menstrual (MHM): “utilização de material de gerenciamento menstrual limpo para absorver ou coletar sangue menstrual, que pode ser trocado com privacidade e com a frequência necessária durante o período menstrual, usando água e sabão para lavar o corpo conforme necessário e com acesso a instalações seguras e convenientes para descartar os materiais de manejo menstrual usados.”

Pobreza Menstrual: “falta de acesso a produtos menstruais, a informação sobre menstruação e a infraestrutura adequada para o manejo da higiene menstrual.”

2. QUESTÕES QUE ENVOLVEM A POBREZA MENSTRUAL:

  • Falta de acesso a produtos adequados para o cuidado da higiene menstrual tais como absorventes descartáveis, absorventes de tecido reutilizáveis, coletores menstruais descartáveis ou reutilizáveis, calcinhas menstruais, etc., além de papel higiênico e sabonete, entre outros; 
  • Questões estruturais como a ausência de banheiros seguros e em bom estado de conservação, saneamento básico (água encanada e esgotamento sanitário), coleta de lixo; 
  • Falta de acesso a medicamentos para administrar problemas menstruais e/ ou carência de serviços médicos; 
  • Insuficiência ou incorreção nas informações sobre a saúde menstrual e autoconhecimento sobre o corpo e os ciclos menstruais; 
  • Tabus e preconceitos sobre a menstruação que resultam na segregação de pessoas que menstruam de diversas áreas da vida social; 
  • Questões econômicas como, por exemplo, a tributação sobre os produtos menstruais e a mercantilização dos tabus sobre a menstruação com a finalidade de vender produtos desnecessários e que podem fazer mal à saúde; 
  • Efeitos deletérios da pobreza menstrual sobre a vida econômica e desenvolvimento pleno dos potenciais das pessoas que menstruam.

3. REALIDADE BRASILEIRA:

  • 30% do Brasil, aproximadamente, menstrua – 60 milhões de pessoas
  • 1,5 milhão de brasileiras vivem em casas sem banheiro
  • Estima-se que uma mulher gaste entre R$ 3 mil e R$ 8 mil com absorventes ao longo de sua vida menstrual 
  • Com base na renda anual dos 5% mais pobres, as mulheres  precisam trabalhar até 4 anos para custear os absorventes que usarão ao longo da vida.
  • 17% de meninas até 19 anos não têm acesso à rede geral de distribuição de água em casa
  • 213 mil meninas não têm banheiro em condições de uso em suas escolas
  • Nas escolas em que há banheiros, 8% não tem papel higiênico, 4% não tem pias em condições de uso e em 37% não há sabonete 
  • 1 a cada 4 meninas que menstruam faltam às aulas em razão do acúmulo de todas as situações anteriores 

Com as informações trazidas já é possível identificar as desigualdades produzidas pela falta de políticas que garantam a dignidade menstrual. Além de evidenciarmos a falta de acesso à informação sobre menstruação, educação sexual nas escolas, produtos menstruais e infraestrutura de saneamento, por exemplo, precisamos que o Estado se aproprie do fim da pobreza menstrual enquanto pauta política. O processo de eliminação da pobreza menstrual e de busca da dignidade menstrual é complexo, por isso precisamos romper com o entendimento de que essa é uma questão individual e não coletiva.

A pobreza e a busca pela dignidade menstrual nos convidam a refletir sobre a sociedade em que vivemos, onde as desigualdades sociais se impõem inclusive em uma função biológica, e como construir as necessárias mudanças. Para além dos pontos trazidos, que apontam os impactos da pobreza menstrual em meninas e jovens, é importante frisar que as desigualdades se estendem a todas as pessoas que menstruam, afetando inclusive o desenvolvimento de nosso país, afinal a pobreza menstrual prejudica a construção de uma realidade mais justa à maior parte da população brasileira.

Referências: 

Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos – https://www.unicef.org/brazil/media/14456/file/dignidade-menstrual_relatorio-unicef-unfpa_maio2021.pdf

Livre Para Menstruar – https://livreparamenstruar.org

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