Luiz Alexandre Souza Ventura*

Nenhuma outra condição representa tanto o medo e o fascínio da população sobre os transtornos mentais como a esquizofrenia. Mais do que um estereótipo, a esquizofrenia afeta cerca de 1 milhão de brasileiros que necessitam de apoio. Uma enorme população que sofre por uma doença, mas, principalmente, sofre pelo preconceito. Até a próxima tragédia envolvendo alguém com esquizofrenia, esse grande contingente permanecerá invisível.

Situações de descaso e abandono são realidades nas famílias de milhares de pessoas com o diagnóstico de esquizofrenia no mundo todo. Por isso, o Dia Mundial da Esquizofrenia (24 de maio), celebrado pela segunda vez no Brasil, lança luz sobre o assunto, que precisa de mais atenção do poder público, especialmente na Saúde.

“Há um enorme preconceito que persegue as pessoas com esquizofrenia por toda a vida. Isso costuma gerar dois comportamentos, principalmente entre os familiares: a negação, que resulta no abandono da pessoa com essa condição mental, ou essa família assume todas as responsabilidades sobre essa pessoa, impedindo sua autonomia”, afirma Marília Cruz, presidente da Agafape (Associação Gaúcha de Familiares de Pacientes Esquizofrênicos), que completa 27 anos em 2019.

Marília é mãe de um homem de 50 anos que tem esquizofrenia. Ela atua na Agafape há 20 anos. “Trabalhamos para defender os interesses dos pacientes e de suas famílias, para uma convivência digna com a doença. Hoje, temos um espaço, chamado de Atelier da Vida, que acolhe essas pessoas e promove uma socialização”, conta.
A presidente da Associação conta que a abordagem a pacientes em surto ainda é um problema. “Quando a família ou algum vizinho aciona o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e informa que se trata de uma pessoa com esquizofrenia, a Polícia Militar é acionada para acompanhar essa abordagem. E isso já resultou em morte do paciente, principalmente quando é mais agressivo, que está com uma faca ou objeto perigoso nas mãos”, comenta Marília Cruz.

SAMU MENTAL – “O atendimento a pessoas com esquizofrenia em momentos de crise ainda não é adequado e precisa ser feito por profissionais de saúde, treinados e orientados, sem a necessidade de intervenção da polícia”, diz o médico psiquiatra Giovanni Salum, coordenador de um projeto chamado Samu Mental, que está ganhando forma dentro da Prefeitura de Porto Alegre (RS), ainda em fase de avaliação, sem previsão de aplicação prática.

“Atualmente, o Samu tem dois profissionais. Quando essa equipe vai atender um chamado de pessoa em surto psicótico, é necessário a participação de outras pessoas nesse atendimento para a contenção desse paciente. Isso cria um efeito de massa”, explica o médico.

“O ideal é que essa equipe tenha, no mínimo, quatro pessoas, e que todos estejam capacitados para conter o paciente e também para aplicar medicamentos específicos”, defende Salum. “Não há nada parecido no País, financiado pelo governo federal ou estaduais. Por isso, cabe à Prefeitura, aos municípios, pensarem nessas soluções”, diz.

SINTOMAS E TRATAMENTOS – O tratamento atual para esquizofrenia é feito conforme o estágio da doença, que começa a se manifestar durante a adolescência. Uma das características que surgem logo no começo é uma espécie de ansiedade social, na qual o indivíduo começa a evitar grupos, inclusive na escola, e se afasta dos amigos.
“A sociedade está longe de compreender a esquizofrenia e, com isso, nasce o preconceito. A doença é relacionada, de maneira totalmente equivocada, a tudo que está desequilibrado ou não é entendido, a comportamentos violentos e, inclusive, como sinônimo de loucura”, comenta a médica psiquiatra Clarissa Gama, professora da Faculdade de Medicina da UFRGS (Universidade Federal do Rio de Grande do Sul) e supervisora de médicos residentes no Hospital de Clínicas de Porto Alegre.

“Há uma tendência de não confirmação do diagnóstico de esquizofrenia, porque essa pessoa será chamada de louca e a busca pelo tratamento será negligenciada. Essa síndrome tem sintomas psicóticos, que não têm relação direta com violência, caracterizados por alterações do pensamento (distorcido e fora da realidade) ou alterações nos sentidos, especialmente da audição, por isso que a pessoa escuta vozes.

Além disso, a pessoa pode ter reações desproporcionais a situações do dia a dia e responder da mesma maneira à morte de um parente ou se ganhar na loteria. Outro ponto afetado é a cognição, com recepção e aplicação das informações, e a forma como essa pessoa constrói uma concepção própria do mundo”, explica a médica.

“Psicose se trata com antipsicótico, como uma febre é tratada com remédio antitérmico”, ressalta Clarissa Gama. “É fundamental que o tratamento da esquizofrenia seja o mais precoce e rápido possível, com doses correspondentes à situação do momento, com redução gradual, mas precisa ser contínuo, assim como é feito com qualquer doença crônica”, diz a especialista.

“É um tratamento para toda a vida, porque a recorrência dos sintomas é muito maior em esquizofrênicos que interrompem o uso do medicamento, independentemente do tempo no qual o paciente já toma o remédio”, explica a psiquiatra.

Há opções de medicamentos no mercado e alguns são distribuídos pelo SUS (Sistema Único de Saúde) – Risperidona (Risperdal), Olanzapina (Zyprexa), Clozapina (Leponex), Quetiapina (Seroquel) e Ziprasidona (Geodon). Não há dados oficiais ou pesquisas sobre as falhas nas entregas desses produtos, no entanto, segundo a Agafape, existem falhas periódicas na entrega desses medicamentos. Essas falhas acabam fazendo com que muitas pessoas, que estavam estáveis com a medicação, passem por crises e necessitem de internação.

Nessa semana do Dia Mundial de Atenção à Esquizofrenia, a CDD está apoiando as ações da Agafape em Porto Alegre (confira aqui a programação – www.agafape.org.br) e estará presente no evento promovido pelo Centro de Estudos Paulista de Psiquiatria, no dia 24 de maio (inscrições aqui – https://www.cepp.org.br/produto/dia-mundial-da-pessoa-com-esquizofrenia/).

Favor incluir parágrafo sobre os eventos do Dia Mundial que ocorrerão em Porto Alegre e também em São Paulo (banner anexo). E dizer que a CDD é apoiadora dos eventos da Agafape e estará presente no do São Paulo.

*Luiz Alexandre Souza Ventura é jornalista colaborador da CDD.

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