por Jota

Eu, no passado, fui responsável pelo acolhimento nas redes sociais. Além de responder os e-mails, Facebook, Instagram e WhatsApp, uma das minhas obrigações era curtir os comentários e responder as dúvidas feitas pelas pessoas nas matérias da AME e da CDD. Sempre nos pautamos em critérios técnicos e científicos para produzir nossos conteúdos, para que nossos portais sejam vistos como fontes de credibilidade e segurança. No entanto, em épocas de fake news e ideologias, isso parece importar pouco.

Relatando essa dificuldade que encontrávamos em nossas reuniões semanais e visto que vivemos em um mundo em que é cada vez mais necessário se posicionar, decidimos construir textos falando sobre a relação entre ideologia e saúde. Afinal, a falta de posturas e pensamentos ligados às experiências de pacientes e conselhos científicos, produzem um conhecimento que induz e nega a realidade.

A própria OMS apontou que a politização atual tem prejudicado mais do que a própria pandemia. Afinal, o que foi a interrupção do financiamento da OMS pelos Estados Unidos, que não motivo ideológico? O que é o uso e a prescrição indiscriminada de cloroquina e hidroxicloroquina, se não por fruto da ideologia? Às vezes, a simples defesa do SUS nos torna passíveis de crítica, de tomar um partido.

Distinções naturais, culturais e formulações racionais sempre existiram, no entanto a ideologia é algo novo, que pode ser datado. O objetivo do texto, assim, é lançar os olhos sobre esse tempo que emergiu com o iluminismo e o século XVIII e que possibilitou a ascensão de um tempo que apagou as experiências e as distinções culturais em nome de uma ideologia.
Como diz o historiador alemão Reinhart Koselleck, há conceitos opostos que são naturais, como homem e mulher, velho e novo, filhos e pais, sadios e doentes, etc.; e culturais como helenos e bárbaros, cristãos e pagãos, ingleses e franceses etc., mas que podem ser politizados e empregados nas disputas cotidianas. Afinal, tomam parte de características e experiências naturais dos seres humanos, traçando posicionamentos e forjando identidades. Ou seja, o uso de conceitos opostos sempre foi uma prática da experiência humana, responsável por fundar pertencimento ou posições,

A ideologia, todavia, é fruto de nossa modernidade, desse tempo filosófico e que não está baseado necessariamente em experiências mas no cálculo racional, não na história, mas em uma filosofia da história. Sob essa perspectiva, o tempo é colocado em progressão, os avançados e os atrasados, transformando as diferenças culturais em desvios morais de cada polo e reforçando posturas de distinção: sou melhor do que você porque você “ainda” não chegou lá.

A ideologia em si não é má, pois muitas vezes precisamos buscar soluções racionais que vão além de nossas experiências. Muitas de nossas revoluções emergiram assim e muitos de nossos conceitos políticos advém dessa raiz, foram pensados por meio da razão, não existindo na prática, são apenas racionalizações.
Mas vocês podem perguntar: e o que isso tem a ver com saúde? O próprio desejo e busca por uma vacina é uma construção racional, pois não existe ainda, mas que certamente emprega dados de uma realidade e de experiências. O problema da ideologia é justamente quando as pessoas defendem um lado sem qualquer ligação com a realidade e com a história, ignorando o bem coletivo. Tentam deslegitimar informações que se baseiam em realidades e pesquisas por pura ideologia, seja de um partido, seja de um presidente ou grupo social, comentando textos ou vídeos sem sequer olhá-los. Afinal, nesses casos, a opinião já é conhecida e já está formada antes mesmo da mensagem.

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